quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Entrou no metrô. Sentiu-se fundir a todo o ambiente em volta. Viu-se derreter e misturar com as paredes do trem velho: amarelo-sem-cor.
Caminhou sem sentir até subir no ônibus de costume.
Estava com os olhos baixos e cheios de lágrima, por isso perdeu o seu ponto. Mascava um pão-de-queijo sem gosto quando levantou num salto e pediu pro motorista parar ali mesmo. Estava no meio da Anchieta.
Desceu do ônibus e começou a caminhar contra o vento. A poeira cansada batia no rosto dela e o gosto amargo do pó veio com o salgado do choro sendo engolido.
"Odeio chorar em público".
Olhou em volta: não tinha ninguém pra testemunhar seu fracasso. Andou devagar pelo meio da estrada, os carros passavam por um triz do corpo miúdo e os passos eram vacilantes, sem vontade.
Quando chegou na calçada, deu mais um gole na coca-cola e acendeu um cigarro. Ambos sem gosto. Na verdade, fazia algum tempo que ela não se lembrava de sentir o gosto de coisa alguma. A torta da mãe, o doce preferido na padaria. Nada. Algumas coisas que ela gostava chegavam até a causar enjôo. Só se dava conta de que estava fumando porque a fumaça arranhava de leve a garganta.
Do alto da passarela que a levaria pra casa ela viu os carros lá embaixo e encarou o asfalto que refletia, cintilante, a luz do sol. A ideia da morte nunca a atraiu, mas naquele momento ela imaginou nitidamente o corpo comprimido no chão e os carros passando por cima, atropelando o que restava da garota.
Olhou o cigarro pela metade.
"Não, ainda não."
Por mais ridículo que parecesse, não conseguia pensar em outra coisa que a impedia de saltar pro abismo senão o fumo inacabado entre os dedos da mão esquerda.
Chegou na sua rua e nunca se sentiu tão perdida. A casa estava a poucos metros de distância mas faltava algo muito maior, um sentimento de pertencimento que ela não conseguia encontrar em lugar nenhum. Ele tinha, a muito tempo, ido embora, talvez junto com o sabor dos alimentos.
Saiu do elevador e abriu a porta de casa. O sol entrava, triste, pela cortina quase transparente da sala.
A bateria do Ipod acabou e a música parou, de repente. A voz da Janis que saía dos fones era a única coisa que restava, e agora também tinha ido embora. Perguntou, em voz alta:
- Quem foi que desligou a música?
As cadeiras, as plantas e a coleção pequena de livros na estante nada responderam.
Estava só.


"'Alguém desligou a música?' fala, olhando a própia barriga. Elmo também reclama aos jogadores do Internacional. Onze deles, mais massagista, preparador físico e técnico estão afixados na porta do banheiro; o glorioso time de 79 e milhares de torcedores colorados empoleirados nas arquibancadas. Um silêncio sepulcral vela a interrogação. Ninguém responde nada."
Márcio Grings

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